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Ibsen Pinheiro: ?Reconstruímos a nossa hegemonia no Rio Grande?
Por Carla Garcia
Ao final de 2012 a sua Executiva havia conquistado expressivo resultado nas eleições daquele ano – o PMDB disputou chapas majoritárias em 80% do Estado –, adquirido uma sede própria para o partido, e ainda deixado as contas em dia. Na oportunidade o senhor afirmou que eram conquistas que se aplicavam à uma família feliz. Hoje o PMDB é uma família feliz? Espero que sim, e como em todas famílias, também há momentos que inquietam e tencionam, pois as famílias são assim. Mas tenho a certeza de que desta vez assumo o partido numa situação melhor. Naquela época vínhamos de uma derrota pesada em 2010. Mas com o programa “O PMDB que eu quero” – que me levou a viajar em dois anos mais do que em toda a minha vida política –, conseguimos injetar no partido a ideia de recuperação. Foi uma oportunidade de aprender que os companheiros não exigem do comando partidário uma resposta positiva, obrigatoriamente. Eles querem uma resposta, e compreendem o não. O que não entendem e não aceitam é o silêncio. Aquela vivência me mostrou uma nova faceta da vida político-partidária, que foi a da convivência estreita com as bases. Agora somos Governo. Isto é uma responsabilidade sem dúvida, mas é também uma conquista que nos orgulha. Fomos para uma campanha num momento em que vivíamos uma divisão interna. Mas acho que o nosso partido teve um talento excepcional para superar essa barreira. Inclusive, acredito que nenhum outro partido cultiva tanto divisões internas como o nosso, mas nenhum administra tão bem essas divisões como o PMDB. E a última eleição foi uma evidência disso. Tivemos uma divergência profunda, nada mais do que pela disputa à presidência da República, mas conseguimos administrar os dois segmentos. Quando nos unimos em torno de Sartori, reconstruímos a nossa hegemonia no Rio Grande. Ao assumir agora o partido, o senhor declarou que uma de suas tarefas será compartilhar as dificuldades com o Governo. O que isso representa? O PMDB tem a tarefa de conviver com os demais partidos da base aliada. E precisamos trabalhar com a ideia de que o espaço no Governo é menor do que o tamanho dos partidos que o compõe. Então, a regra é não haver atendimento integral às pretensões de participação quantitativas. O que podemos fazer sim, e compensará, é uma participação qualitativa tanto quanto possível e igualitária. Também temos a intenção de compartilhar com os partidos o esforço para manter as alianças onde for possível para 2016. Sabemos, por exemplo, que disputar uma eleição no meio de um mandato governamental geralmente pega o Governo no seu momento de maior dificuldade. Mas o partido fica as vezes mais a vontade do que o governador para esmiuçar essas dificuldades e conflitos. Ainda temos a tarefa de sustentar que apesar das dificuldades temos que olhar para frente, sem ignorar o passado, pois isso seria desprezar a construção do futuro. Tenho certeza, até pela postura do governador Sartori, que esse compartilhamento será positivo. O Governo terá ouvidos para nos ouvir e o PMDB pernas para caminhar pelo nosso Governo. E quando o descontentamento parte do PMDB? Quando um posto que é reivindicado pelo PMDB acaba se destinando a outro partido, faço dois questionamentos iniciais: que tipo de pessoa foi indicada? Qual o seu partido? E quando a resposta é de que se trata de uma pessoa qualificada para o cargo e ligada a um partido aliado, acredito que temos de aceitar o fato como absolutamente normal. Esses dois aspectos resolvem quase todas as dificuldades ou atenua o descontentamento. O PMDB terá razão sim de contestar quando o referido posto não está nas mãos de um aliado. A Bancada do partido na AL está preparada para o debate com a sociedade e com a oposição? A oposição de hoje não é a mesma de meia dúzia de anos atrás. O Partido dos Trabalhadores forjou sua oposição na época da resistência, não tanto quanto o PMDB, mas também naquele período. E tinha na credibilidade um instrumento poderosíssimo para o seu discurso. E até os seus exageros vinham confortados pela sua imagem. Agora, aquela oposição transformou-se para o bem e para o mal numa força política igual as outras. Para o mal, nos vícios que praticou visivelmente. Para o bem, mostrou que é um partido real, composto por pessoas reais, que tem virtudes e fraquezas. Nunca deixo de lembrar uma lição de Cristo ao fundar a sua igreja. Ele a fundou sob o símbolo da pedra fundamental que representa também as fraquezas humanas. A história conta que foi o apóstolo Pedro quem vacilou, que negou o seu líder espiritual, pois era um ser humano que estava ali. O que quero dizer com isso? Que quando a pureza se transforma na bandeira moralista, quem corre o maior perigo é a moralidade. Nada mais é inimigo da moralidade do que o moralismo como instrumento político. Os últimos fatos da política nacional produziram uma equalização. Isto quer dizer que, ao olhar o cenário hoje, ninguém é santo por definição, mas também ninguém deve ser culpado sem comprovação. O enfrentamento político deverá ser menos agressivo? Espero que o enfrentamento político ocorra dentro do padrão de normalidade. A oposição terá o ardor que quiser, mas certamente não substituirá a realidade. O PT se sentia tão legitimado que contrariou três momentos cruciais da vida nacional: não votou em Tancredo Neves, não assinou a Constituinte e não votou no Plano Real. E esses três fatores mudaram o Brasil. Hoje o debate político ocorrerá em função da sua objetividade. Tenho convicção, por exemplo, que o modelo de endividamento do Estado, como se ele pudesse ser fundamento em políticas sociais, se esgotou. A ideia de que o endividamento sustenta políticas sociais é duplamente negativo, mascara o endividamento e forja uma falsidade de benefícios sociais que não se sustentam. Delfim Neto (ministro da Fazenda de 1967 a 1974), por mais penoso que pudesse parecer à época, tinha razão, não se pode dividir o bolo sem antes fazê-lo crescer. Mas a resistência à essa frase produziu o oposto: a divisão do bolo sem que ele exista. O debate político se tornou mais preciso depois que a realidade política botou o PT no seu lugar, ou seja, de partido político de seres humanos. A 2ª meta anunciada é a luta pela retomada do protagonismo do PMDB nacional. Vivemos um momento de total indignação. Qual o papel do partido diante dessa realidade? Estou convencido de que se os partidos não conduzirem a insatisfação para um caminho que busque soluções, a política será a primeira vítima. Essa inquietude do sentimento nacional tem uma virtude, ela não é preparada e nem condicionada, é espontânea. Porém, a espontaneidade tem os seus vícios, pois as vezes não sabe buscar o rumo de superação. Tenho clareza que se não houver condução política os resultados possíveis serão a inércia ou a desordem. A inércia porque a perplexidade não encontra caminhos. E a desordem porque a perplexidade se presta aos aventureiros ou a insensatez. Por isso temo pela falta de protagonismo dos partidos, entre eles o PMDB, que é o maior e tem uma responsabilidade histórica. E quem diz isso é um peemedebista não alinhado ao governo da República, que, apesar da divergência com a direção nacional, ajudou a construir uma vitória no Rio Grande. Essa divergência não me impede de ter responsabilidade com o meu partido e com a situação. Por isso me elegi com o compromisso de manter essa boa relação na busca de superação. Na gestão anterior, o senhor já adotou essa postura. Na primeira semana daquela gestão, recebemos o presidente Michel Temer e garantimos a nossa capacidade de, apesar das divergências, manter a vinculação com a direção nacional. Agora, neste momento em que o país tem tanta incerteza, queremos ser parceiros das soluções. Nossa posição diversa do PMDB nacional não existirá na hora da preservação das instituições democráticas e da busca de caminho político para superação das dificuldades. Nesses dois aspectos centrais não há diferença entre a direção nacional e o comando do Rio Grande. O que achou de Temer na articulação política? Tecnicamente é irrepreensível a convocação do vice-presidente. Digo tecnicamente porque esse é um governo que não consegue exercitar a sua maioria no Congresso. Dispõe agora do esforço de quem presidiu aquela Casa por três vezes, de quem esteve lá por 25 anos, de quem tem um estilo pessoal de convivência e cultiva o respeito. Por conta disso, o merece também. Do ponto de vista técnico de armação de uma estrutura política é irretocável. E isso está vinculado ao que vai acontecer com brevidade no mundo das decisões políticas. Por exemplo, o ajuste fiscal é necessário pelas circunstâncias que se encontra o País. É verdade que da minha posição não me custa responsabilizar a política equivocada de benefícios sociais sem fundamento, mas, por outro lado, não posso negar que esse mesmo governo que negou essa obviedade agora a percebe. Mas o grande partido que é o PMDB e que ocupa a vice-presidência da República tem que ter a noção do que aconteceu, mas também a clareza de que é preciso contribuir para a estabilidade democrática e a busca de soluções políticas. Que soluções seriam essas? A primeira delas é o ajuste fiscal. É necessário recolocar o País na sua realidade, especialmente na realidade da administração. O Brasil está melhor do que o seu Governo. Eu diria que hoje a máquina estatal brasileira freia o Brasil, e no Rio Grande do Sul isso é ainda mais agudo. A sua terceira prioridade será as eleições municipais? Na primeira reunião da Executiva após a convenção, debatemos essas três tarefas: compartilhar com o governo as suas dificuldades e os sonhos, conviver com a direção nacional na busca de caminhos responsáveis e preparar as eleições municipais. Conversei com o secretário-geral, o companheiro Gabriel Souza, e a ideia é visitar os companheiros de todo o Estado. Vamos criar mecanismos que permitam essa interação da liderança partidária com suas bases. Iremos esmiuçar essas possibilidades em nossas reuniões semanais da Executiva. Também buscaremos a criação de conteúdo, pois eles não apenas mexem com a nossa racionalidade, mexem também com o nosso sentimento e imaginação, incendeiam o sentido da luta política. Na sua gestão anterior, o debate foi sobre a distribuição dos royalties do petróleo. Foi bonita essa discussão. E gostei também da vitória do Sartori. Ganhamos porque tivemos a ideia e o caminho corretos. Tivemos o melhor candidato e depois tivemos um bom marketing, sem deixar de mencionar o slogan “O Meu Partido é o Rio Grande”. A gente teve base concreta e imaginação. Tudo isso nos conduziu para o que há de melhor na vida pública: você fazer as coisas que acredita e elas darem certo mesmo quando são difíceis. O fato de as eleições municipais ocorrerem exatamente no momento mais crítico para o Governo poderá implicar no desempenho do PMDB? O espírito do governador, com o seu perfil de administrador e a sua capacidade política, tenho a impressão de que irá liderar junto de sua base a superação de todas essas dificuldades. E o PMDB como partido estará na linha de frente desse processo e vai demonstrar isso ao longo dos próximos meses. Perfil Ibsen Valls Pinheiro, 79 anos, é natural de São Borja. Formado em Direito pela PUC/RS, atuou como jornalista, advogado, promotor e procurador de Justiça. Foi vereador, deputado estadual, deputado federal, presidiu a Câmara dos Deputados em 1991 e 1992, tendo ocupado interinamente a presidência da República em 20 de novembro de 1992. Foi presidente do PMDB gaúcho de 2010 a 2012. À pedido do PMDB gaúcho, concorreu à Assembleia Legislativa nas eleições de 2014, assumindo uma das cadeiras do Parlamento gaúcho no ano de 2015. |
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